Antes de criar um curso online, um e-book, um SaaS ou qualquer outro produto digital, a maioria das pessoas cai na mesma armadilha: passa meses produzindo algo que ninguém pediu, ninguém quer e ninguém paga. A boa notícia é que dá para evitar isso usando um processo simples de validação com pesquisas, protótipos e pré-vendas.
Neste artigo, vou te mostrar um passo a passo prático, no estilo que eu uso nos meus próprios projetos: nada de teoria solta. A ideia é que você termine a leitura com um plano claro para saber se a sua ideia merece tempo e dinheiro — ou se é melhor pivotar antes de se frustrar.
Por que validar uma ideia de produto digital antes de construir
Vamos ser diretos: “gostar da ideia” não é validação. Sua mãe achar legal também não é validação. Curtidas no Instagram menos ainda.
Validação de verdade envolve pessoas dispostas a:
- Falar do problema que elas têm
- Mostrar como estão resolvendo hoje
- Reservar vaga, entrar na lista de espera ou pagar para acessar sua solução
Quando você valida, você:
- Evita investir meses em algo que não tem demanda
- Descobre como o seu público chama o problema (as palavras exatas que vão para a copy)
- Ajusta o formato do produto (curso, mentoria, app, planilha, comunidade, etc.) de acordo com a realidade
- Começa a vender antes de ter tudo pronto, gerando caixa para financiar o desenvolvimento
O objetivo da validação não é acertar tudo de primeira, e sim errar rápido e barato. Vamos ver como fazer isso na prática.
Etapa 1: transformar a ideia em hipótese clara
Antes de fazer pesquisa, você precisa formular sua ideia como uma hipótese testável. Algo que possa ser confirmado ou rejeitado pelos dados.
Estrutura simples que você pode usar:
- Público: para quem é esse produto?
- Problema: que dor ou desejo específico ele resolve?
- Solução: qual forma o produto terá? (curso, app, membership, planilha, etc.)
- Resultado: que transformação clara você promete?
Exemplo prático:
“Para freelancers iniciantes em desenvolvimento web (público) que estão perdidos para conseguir os primeiros clientes (problema), vou criar um programa online de 6 semanas com aulas e templates (solução) para que eles fechem pelo menos 3 clientes pagantes em até 60 dias (resultado).”
Agora você tem uma hipótese. A validação vai responder: existe gente suficiente com esse problema, interessada em pagar por essa solução, nesse formato e com esse resultado?
Etapa 2: validar com pesquisas (qualitativas e quantitativas)
Pesquisa é o seu primeiro filtro. Aqui você não tenta vender nada ainda. O objetivo é entender:
- Se o problema existe
- Quão doloroso ele é
- Como as pessoas estão tentando resolver hoje
- O que já testaram e não funcionou
Pesquisa qualitativa: conversas 1:1
Essa é a parte mais ignorada e, ao mesmo tempo, a que mais traz insight prático. Você precisa de 5 a 15 conversas bem feitas com pessoas que se encaixem no seu público.
Algumas perguntas que eu uso nas minhas validações:
- “Me conta um pouco sobre sua rotina em relação a [tema do produto].”
- “Qual é o maior desafio que você enfrenta hoje com [problema]?”
- “O que você já tentou fazer para resolver isso?”
- “O que funcionou? O que não funcionou?”
- “Se isso fosse resolvido de forma ideal, como seria sua situação daqui a 3 meses?”
- “Você já pagou por algo para resolver esse problema? O quê? Quanto?”
Observe:
- Que palavras a pessoa usa (isso vai direto para sua copy)
- Se ela fala do problema com emoção (frustração, ansiedade, urgência)
- Se ela já pagou (ou tentou pagar) por soluções
A grande bandeira vermelha: pessoas que dizem “legal, um dia eu teria esse produto” mas não conseguem lembrar de nenhuma ação concreta que já tentaram tomar para resolver o problema. Em geral, não são bons compradores.
Pesquisa quantitativa: formulários e enquetes
Depois das conversas, você já terá uma noção das principais dores e objeções. Aí entra a pesquisa quantitativa para ganhar volume.
Você pode usar Google Forms, Typeform ou até enquetes no Instagram / Telegram. O importante é que as perguntas sejam objetivas e estratégicas.
Algumas perguntas úteis:
- “Em uma escala de 1 a 5, quão incômodo é hoje para você [problema]?”
- “Qual dessas opções define melhor a sua situação?” (com alternativas bem pensadas)
- “Você já investiu dinheiro para resolver esse problema?” (Sim / Não)
- “Qual dessas frases mais representa você hoje?” (aqui você testa proposta de valor)
- “Se existisse um programa que te ajudasse a [resultado], o que ele precisaria ter para você considerar pagar por ele?”
Como saber se a ideia está indo bem nessa etapa?
- Boa taxa de resposta (as pessoas se interessam em falar sobre o problema)
- Pelo menos 30–50 respostas qualificadas (dependendo do nicho)
- Mais de 60% das pessoas classificando o problema como 4 ou 5 em incômodo
- Uma porcentagem relevante dizendo que já tentou outras soluções
Com isso, você já deve ter certeza de duas coisas: o problema existe e importa. Agora é hora de testar a solução antes de construir.
Etapa 3: validar com protótipos (sem produto pronto)
Protótipo é uma versão simplificada da experiência final, usada para testar interesse e clareza da proposta. Não é o produto completo — é o mínimo necessário para ver se as pessoas se movem.
Alguns tipos de protótipos que funcionam muito bem para produtos digitais:
- Rascunho de módulo/aulas (no caso de cursos)
- Wireframe ou layout simples (no caso de apps/SaaS)
- Versão demo em vídeo (você mostrando como seria)
- Landing page com proposta de valor (meu favorito)
Landing page de validação
A landing page é o seu protótipo mais importante. Ela precisa responder, de forma rápida:
- Para quem é
- Que problema resolve
- Qual transformação promete
- Como funciona na prática
- O que a pessoa precisa fazer agora (call to action)
Exemplos de CTAs para validação:
- “Entrar na lista de espera”
- “Aplicar para a turma beta”
- “Responder um formulário rápido para ter acesso antecipado”
- “Reservar vaga com valor de pré-lançamento”
Nesta etapa você ainda não precisa cobrar (isso vai entrar na pré-venda), mas já pode medir o interesse real com cadastros.
Indicadores que eu costumo olhar:
- CTR mínimo razoável nos anúncios / divulgação (as pessoas clicam, então a ideia chama atenção)
- Taxa de conversão da página (gente deixando e-mail/WhatsApp ou aplicando)
- Mensagens espontâneas de pessoas perguntando “quando começa?” ou “quanto vai custar?”
Etapa 4: validar com pré-venda (gente pagando antes de estar pronto)
Agora vem o ponto decisivo: alguém paga para ter acesso antecipado ou garantir vaga? Se a resposta for sim, você tem uma validação forte. Se for não, você tem feedback para ajustar antes de investir pesado.
Pré-venda não é enganar ninguém. É deixar claro que:
- O produto ainda não está pronto
- O comprador terá acesso antecipado, condições especiais ou participação na construção
- Há uma data estimada para entrega e um plano
Modelos de pré-venda que funcionam bem
Você pode adaptar de acordo com o seu tipo de produto, mas aqui vão modelos que eu já usei e vi funcionar:
- Turma beta com desconto agressivo
Você abre poucas vagas para um grupo inicial com preço bem menor, em troca de feedback, depoimentos e paciência com ajustes. - Pré-venda com bônus exclusivos
Em vez de desconto, você oferece algo que não estará disponível depois: encontro ao vivo extra, consultoria em grupo, templates, comunidade fechada. - Licença vitalícia (no caso de software)
Uma vez paga, a pessoa nunca mais paga mensalidade. Isso ajuda a levantar caixa para desenvolver o produto.
O mais importante é você ter uma oferta clara e uma forma objetiva de pagamento (Pix, cartão, boleto, Stripe, etc.).
O que observar na pré-venda
A pergunta que sempre aparece é: “Quantas vendas eu preciso para considerar validado?”. Não existe número mágico, mas alguns critérios ajudam:
- Para produtos de ticket baixo (até R$ 300): algo entre 10 e 30 vendas iniciais já é um sinal interessante
- Para tickets médios (R$ 300 a R$ 2.000): se você conseguir 5 a 15 vendas, já mostra boa tração
- Para tickets altos (acima de R$ 2.000): até 3 a 5 vendas já justificam continuar
Mais importante que o número absoluto é a taxa de conversão em relação às pessoas realmente interessadas (lista, leads, audiência). Por exemplo:
- Você tem 200 pessoas na lista de espera
- Envia a oferta de pré-venda
- 20 pessoas compram
Isso é uma taxa de 10%. Para um primeiro teste, é excelente.
Como ajustar a rota com base nos dados
Depois das três etapas (pesquisa, protótipo, pré-venda), você terá três possíveis cenários:
- Cenário A – Interesse alto e vendas
Pessoas responderam pesquisa, clicaram na landing, entraram na lista e compraram na pré-venda.
Resultado: siga em frente, execute o produto, entregue o que prometeu e colete feedback. - Cenário B – Interesse médio, poucas vendas
Há curiosidade, mas pouca ação de compra.
Resultado: ajuste proposta de valor, formato, preço ou público. Talvez o problema exista, mas você ainda não encontrou a combinação certa. - Cenário C – Baixo interesse, quase nenhuma venda
Poucos respondem pesquisa, ninguém entra na lista, ninguém compra.
Resultado: sinal forte de que a ideia, como está, não se sustenta. Você pode pivotar para outro problema, outro público ou engavetar por enquanto.
O erro é insistir em um Cenário C só porque você “gosta muito da ideia”. Seu gosto não paga boletos.
Exemplo real de validação na prática
Imagine que você quer lançar um mini-curso sobre “Produtividade para Devs Freelancers”. Um fluxo prático poderia ser:
- Você conversa com 10 devs freelancers e descobre que a maior dor não é “produtividade genérica”, e sim organizar demanda de múltiplos clientes ao mesmo tempo.
- Você cria uma landing page com a proposta: “Organize seus projetos de clientes em 7 dias usando um sistema simples no Notion”. CTA: lista de espera.
- Divulga a página para a sua audiência e grupos de devs. 120 pessoas se cadastram.
- Você envia uma pré-venda: mini-curso + templates + workshop ao vivo por R$ 97 para os 50 primeiros.
- Em 3 dias, 27 pessoas compram.
Você não precisa de sinal mais claro que esse. A partir daí, o seu risco diminui muito porque:
- Você já tem caixa para produzir
- Já tem um grupo engajado para testar, sugerir melhorias e dar depoimentos
- Já sabe quais módulos priorizar, porque ouviu as dores antes
Erros comuns na validação (e como evitar)
Algumas armadilhas aparecem em praticamente todo projeto digital:
- Confiar em elogios vazios
“Nossa, que ideia incrível, quando lançar me avisa!” — isso não é validação. Validação é quem responde pesquisa, entra na lista e, principalmente, paga. - Fazer pesquisa só com amigos e família
Eles querem te incentivar, não te dar um choque de realidade. Você precisa falar com quem realmente tem o problema. - Pular a etapa da pesquisa qualitativa
Sem conversa 1:1, você perde as nuances. Formulário não substitui ouvir a pessoa explicando a situação dela. - Esconder que é pré-venda
Seja transparente. Quem entra no beta sabe que vai receber algo em construção — e muitas vezes gosta disso. - Desistir rápido demais
Às vezes o problema é bom, mas a forma como você está oferecendo não está clara. Ajustar copy, título, promessa e preço faz diferença.
Checklist rápido para validar sua ideia de produto digital
Para facilitar, aqui vai um checklist que você pode literalmente imprimir ou salvar e ir marcando:
- Defini a ideia como uma hipótese clara (público, problema, solução, resultado)
- Listei onde esse público já está (grupos, redes, comunidades, eventos)
- Conversei com pelo menos 5–15 pessoas do público-alvo (pesquisa qualitativa)
- Identifiquei:
- As palavras exatas que elas usam
- Como elas tentam resolver hoje
- O que mais dói e o que elas mais desejam
- Criei uma pesquisa rápida (formulário) e coletei pelo menos 30–50 respostas
- Criei uma landing page simples com:
- Headine clara
- Para quem é
- Problema
- Transformação
- Como funciona
- CTA (lista de espera, aplicação, etc.)
- Divulguei a landing para a audiência certa (e não só para amigos)
- Analisei taxa de conversão da página e interesse real
- Montei uma oferta de pré-venda justa (preço, benefícios, coisas exclusivas para early adopters)
- Abri a pré-venda por um período definido (ex: 3–7 dias)
- Medi quantas vendas fiz e a taxa sobre a base interessada
- Tomei uma decisão racional: seguir, ajustar ou pivotar
Próximos passos: como colocar isso para rodar ainda esta semana
Se você já tem uma ideia de produto digital na cabeça, não precisa esperar meses para saber se ela tem futuro. Um plano realista para os próximos 7 dias poderia ser:
- Dia 1: formular sua hipótese (público, problema, solução, resultado)
- Dia 2–3: conversar com 5–10 pessoas do público-alvo
- Dia 4: montar uma pesquisa rápida e divulgar
- Dia 5: criar uma landing page simples (pode ser em WordPress, Notion, Card etc.)
- Dia 6: enviar a landing para quem respondeu a pesquisa e para suas redes
- Dia 7: analisar os dados e desenhar a pré-venda
A partir daí, é ajustar, abrir a pré-venda e deixar o mercado responder. Em vez de passar seis meses trancado produzindo algo às cegas, você transforma cada semana em um experimento com retorno mensurável.
Produto digital não é loteria. Com pesquisa certa, protótipos estratégicos e pré-venda bem feita, você diminui o risco, aumenta as chances de acerto e, principalmente, para de adivinhar o que as pessoas querem — e passa a perguntar, testar e cobrar por isso.